Maçonaria na cidade eduardiana

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Maçonaria na cidade eduardiana

Andrew Prescott

É uma coincidência singular que 2009, que marcou o centenário da Associação de Manchester para a Pesquisa Maçônica, também tenha visto o falecimento dos três últimos soldados sobreviventes que viviam na Inglaterra e serviram na Primeira Guerra Mundial, William Stone, Henry Allingham e Harry Patch. Na leitura dos obituários destes três homens extraordinários, uma das coisas mais impactantes é a descrição de suas vidas antes da Guerra. As vidas destes veteranos antes do início da Primeira Guerra Mundial em 1914 eram, de muitas formas, reconhecíveis para alguém como eu, que nasci nos anos 50, mas que para outras pessoas parece pertencer a um mundo extremamente remoto. Harry Patch, durante sua infância em Somerset, habitava um universo de fortes lealdades e perspectivas locais que parece inconcebível hoje, no mundo multinacional e conectado à internet. William Stone era o décimo de quatorze filhos e foi mandado ao trabalho em uma fazenda local aos treze anos. Seu irmão mais velho foi à Índia com o exército em 1908 e nunca mais se ouviu falar dele. Henry Allingham foi o único dos três criado em uma cidade, Clapton, no leste de Londres. Novamente, a cidade onde Henry Allingham cresceu é reconhecível apenas parcialmente – Allingham começou a trabalhar como um fabricante de instrumentos cirúrgicos e depois se tornou técnico de construção cívica – ofícios comuns na época, mas que agora desapareceram de Londres.

Estes três veteranos, William Stone, Henry Allingham e Harry Patch, são lembranças do grande abismo histórico apresentado pela Primeira Guerra Mundial. Para os historiadores, o período entre 1900 e 1914 foi de enormes dificuldades, já que seus aspectos parecem familiares e modernos. Ao mesmo tempo, estes anos que precederam a Primeira Guerra Mundial são tão remotos e incompreensíveis quanto a Idade Média. Pensando na Associação de Manchester para a Pesquisa Maçônica, somos confrontados com frequência confrontados com uma dificuldade, de que alguns aspectos parecerão muito familiares aos maçons atuais, e outros não se acercarão desta realidade. Como era a maçonaria de 1909 em uma grande cidade como Manchester? Como a maçonaria se encaixou no cotidiano desta cidade eduardiana? Estas são as questões que eu gostaria de abordar de forma breve neste artigo. Este é um assunto que tem potencial para ser uma grande discussão, e eu não posso fazer mais do que dar algumas informações resumidas, mas espero poder, de alguma forma, transmitir com a Associação encaixou-se na cidade, a princípio.

Não apenas 2009 foi o ano do falecimento destes três veteranos, mas também foi o ano em que o romance de Dan Brown, Dealing with Freemasonry, foi lançado finalmente. O Manchester Guardian de 24 de junho de 1909 trazia uma crítica literária do último livro do homem que talvez possamos chamar de resposta de Manchester a Dan Brown (ou, pelo menos, Michael Baigent), de nome John Yarker. O crítico do Guardian declarou que The Arcane Schools, de John Yarker deveria figurar o ranking das curiosidades da literatura maçônica, embora ousemos esperar que ele não represente o tipo de história ensinado nas Lojas Maçônicas. Acusando Yarker de possuir a ‘credulidade que parece ilimitada’, o crítico concluiu que ‘Os não iniciados não podem distinguir se o relato do Sr. Yarker sobre a maçonaria moderna é mais autêntica do que seu retrato fantasioso do passado remoto. Mas ele é, claramente, ignorante de todos os primeiros princípios do ceticismo histórico’. Yarker escreveu uma carta expressando sua cólera ao Guardian em 1º de julho, protestando contra a crítica e insistindo que ele estava apenas recordando as ‘lendas arcaicas’ descritas em seu livro, algo que ele sentia ser uma iniciativa acadêmica válida. Entretanto, em um ponto, Yarker concordou com a crítica, este era o fato de tais lendas antigas não serem ensinadas nas Lojas Maçônicas. Até onde Yarker sabia a única literatura estudada nas Lojas Maçônicas da Manchester eduardiana era o menu, com uma diferença ocasional causada pelo Templo de Solomon.

Alguém pode perguntar-se até que ponto esta pequena comoção no Manchester Guardian fez somar ao ímpeto de formar Associação de Manchester para a Pesquisa Maçônica. Esta é, certamente, uma controvérsia que tem tons modernos, com a insistência de Yarker em conectar a maçonaria ao conhecimento esotérico e seu menosprezo por sua dimensão social. Mas na cidade eduardiana era, provavelmente, o aspecto social da maçonaria muito mais importante. A maçonaria era mais proeminente na vida cotidiana da sociedade eduardiana do que é hoje, mas em geral o foco da maçonaria eduardiana era a promoção de uma sociabilidade amigável, ao invés do encorajamento de tal especulação mística e esotérica às quais Yarker era adicto. Relatórios das atividades das lojas maçônicas eduardianas lembram o comentário de Cardinal Newman ao Papa Pio IX que ‘a maçonaria inglesa é um clube de gansos’.

A coluna de esportes do jornal reportou as partidas maçônicas de golfe e tiro e descreveu competições de bilhar de tirar o fôlego que aconteceram nos salões maçônicos. Um dos grandes hits teatrais dos primeiros anos do reino do Rei Eduardo era uma farsa chamada Are You a Mason, que estreou no Teatro do Príncipe em 1903. As críticas revelaram que os rituais da maçonaria, de fato, se adequavam a uma farsa, comentando que ‘Mesmo os maçons genuínos não deixam de entreter-se com os esforços dos sham brethren para enganarem-se uns aos outros e impor aos amigos e parentes os sinais maçônicos de forma muito engenhosa’. A peça foi comparada, de forma favorável, a outro hit recente, Charley’s Aunt.

Para toda a depredação das bombas e desenvolvedores, a topografia da cidade eduardiana é a mesma que ainda vivemos e trabalhamos. Entretanto, as cidades eduardianas ainda estavam em formação. A expansão e industrialização massivas do início do período vitoriano não eram diferentes de catástrofes naturais em muitas cidades, com os empreendedores bem sucedidos deixando a cidade assim que possível. Mais no fim do período vitoriano viu um reconhecimento tardio da necessidade de criar-se uma infraestrutura física para apoiar a vida neste novo ambiente urbano, mais conhecida nos sistemas sanitários e de transporte de Londres. Mesmo assim as cidades continuaram a crescer de forma inexorável, e grandes subúrbios se formaram para os exércitos de clérigos que precisavam servir as organizações do século XIV. No período eduardiano, vemos uma mudança nas prioridades urbanas, com o desenvolvimento de infraestrutura física menos proeminente e mais ênfase na importância do estabelecimento de novas instituições civis, desenvolvendo novos serviços públicos e criando novas formas de engajamento cívico e sociabilidade. Assim, os últimos anos do reino vitoriano viram a inauguração de uma nova autoridade local para a área da grande Londres, o Conselho do Condado de Londres. A maçonaria caminhou de mãos dadas com estes desenvolvimentos, com a Loja do Conselho do Condado de Londres No. 2603, inaugurada em 1895. Em 1900, o primeiro município foi estabelecido em Londres para coordenar os serviços nos subúrbios que cresciam; em alguns anos lojas maçônicas eram criadas para os conselheiros e ajudantes de novos municípios como Wandsworth.

A forma como a maçonaria estava envolvida de forma íntima com estes desenvolvimentos civis na cidade eduardiana é vividamente ilustrada por um artigo do Liverpool Daily Post de 1909, que foi reimpresso acordadamente no The British Architect. O artigo sublinhava que ‘a fábula dos tijolos e morteiros de Liverpool nos anos anteriores foi creditado a todos os interessados’. Sublinhava também os grandes avanços disponíveis na cidade, ‘o Edifício do Conselho do Cais, a troca de algodão, a nova catedral, o novo esquema para o Hospital da parte Sul’. Entretanto, continuava o artigo, havia uma necessidade de foco maior na vida cívica: um salão com localização central, de grande qualidade arquitetônica, com uma sala de assembleias com capacidade para mil pessoas, e uma sala de discursos com metade deste tamanho, com uma galeria de arte, restaurante e salas de reunião. Liverpool declarou o Daily Post, poderia bancar com facilidade uma causa tão nobre, que dariam à cidade tantas e imensas vantagens comerciais. ‘com um edifício assim, não há dúvida de que Liverpool tornar-se-ia um terreno propício para congressos, conferências e convenções de todos os tipos. Pode-se quase escutar o editor salivando enquanto imagina os mercados potenciais: ‘sínodos da Igreja, sociedades eruditas e reuniões maçônicas’. Talvez seja este o ponto onde percebemos repentinamente como a maçonaria eduardiana tinha uma relação diferente com a sociedade cívica. É difícil imaginar uma proposta de um novo centro cívico nos dias de hoje ser apoiado com base na atração que exerceria nos maçons locais. Mas este era o caso no noroeste da Inglaterra à época da formação da Associação. Enquanto construíam-se grandes e novos salões da cidade, disputavam para ser sede de negócios maçons – Battersea, no norte de Londres era um novo salão, particularmente opulento, era usado por uma loja local, o zelador foi iniciado para que os cuidados necessários para a reuniões fossem melhor compreendidos por ele.

O novo Guildhall de Liverpool que fora proposto não fora construído, mas outro grande edifício estava sendo construído na cidade àquela época, a Catedral Anglicana de Cristo em Liverpool. A construção desta catedral era um resultado direto da resposta vitoriana ao crescimento das novas cidades industriais. Para os vitorianos, a falta de acomodações espirituais nas novas cidades era tão chocante – se não mais – do que transporte ou condições sanitárias inadequadas. Novas dioceses foram construídas para servir à nova população urbana, incluindo a diocese de Liverpool, de 1880. A competição para a construção de uma nova catedral aconteceu em 1902 e o desenho vencedor, de Giles Gilbert, levou à construção da maior catedral do Reino Unido e a quinta maior do mundo. A Província Oeste de Lancashire dos Maçons, conhecida naquele tempo como a maior província maçônica do mundo, teve uma participação essencial na construção da Catedral de Liverpool, levantando 10.000£ em cinco anos para a construção da capela, dedicada à memória de seu Grão-Mestre Provincial, Earl Lathom Primeiro. Em julho de 1906, o Duque de Connaught depositou a pedra angular da capela em uma cerimônia que não é tão conhecida quanto o estabelecimento da pedra angular da Catedral Truro, vinte anos antes, mas foi de muitas formas um estabelecimento mais eloquente da importância da maçonaria na sociedade da época. A cerimônia foi lindamente reportada pelo Manchester Guardian, que descreveu os procedimentos como cheios de cores, com o sol iluminando cada centímetro com escarlate e dourado.

O trabalho dos Maçons do Oeste de Lancashire no levantamento do dinheiro para este traço majestoso da nova Catedral de Liverpool é uma expressão vívida da importância da maçonaria no forjamento dos novos espaços cívicos da cidade eduardiana. As sedes da Maçonaria do Oeste de Lancashire estão, é claro, na Rua Hope, que hoje conecta as duas catedrais de Liverpool, e os salões maçônicos formavam uma parte integral dos complexos centrais dos edifícios cívicos, tão importantes na era eduardiana. Em Sheffield, o salão maçônico da Rua Surrey, estendido em 1911, fora uma das primeiras partes do complexo central dos edifícios cívicos que incluíam a prefeitura e uma imponente Biblioteca municipal. Da mesma forma, em Manchester, o salão maçônico na Rua Cooper era uma adjacente direta da celebrada prefeitura, e como este salão maçônico de Sheffield, fora uma das primeiras partes de seu centro cívico a ser construída, um pouco antes da prefeitura. As primeiras reuniões da Associação de Manchester para a Pesquisa Maçônica foram, é claro, realizadas na Rua Cooper. Uma descrição particular da atmosfera da Rua Cooper foi publicada em uma revista chamada The Sphinx em 1869. Eu peço desculpas por não ter a descrição da Rua Cooper no período eduardiano, mas parece ter sido um edifício onde nada mudou muito, e esta descrição do Salão Maçônico de Manchester de 1869 servirá para o período eduardiano.

À época em que o artigo do The Sphinx foi escrito, o prédio tinha apenas alguns anos de idade, mas nas palavras do jornal, ‘já tinha adquirido a posição de antiguidade, tendo sido coberto com a fuligem de Manchester’. O artigo prosseguia: ‘tem muitas cornijas salientes, muitos recantos, e muitos cantos na parte externa para a atmosfera de Manchester, e combinando, tem uma aparência suja e melancólica’. Infelizmente, esta atmosfera suja se estendia até o interior. ‘Precisa, desesperadamente, de luz e cor’, comentava o artigo. ‘Algumas das salas – como, por exemplo, a sala de jantar – são sombrias e escurecidas. Até mesmo o salão principal, onde as lojas celebram seus ritos e cerimônias, precisa muito de ornamentos e de luz; embora a escuridão solene possa ser necessária aos espetáculos maçônicos; e de fato, como tais espetáculos acontecem à noite, o salão deve ser usado durante o dia muito raramente’.

Outra funcionalidade que chocou o The Sphinx foi o Clube dos Maçons de Manchester, que usava a sala de jantar e outras durante o dia, até as cinco. O clube exibia duzentos membros, todos maçons. O escritor do artigo ficou particularmente intrigado foi com o fato de os membros serem votados, formando um clube dentro de um clube, talvez um dos mais difíceis do mundo para entrar. Embora os membros fossem todos maçons, novos candidatos eram excluídos com frequência. O Clube dos Maçons de Manchester tinha um número de espaços para seu uso exclusivo. O primeiro era a sala de fumantes, mas esta era pouco utilizada, já que os membros preferiam fumar na biblioteca. Biblioteca era outro termo errôneo, já que havia lá algumas poucas prateleiras vazias, embora fosse decorada com lindos retratos dos Grão-Mestres Provinciais. A sala de leitura tinha apenas dois jornais de Londres. A sala mais frequentada do clube era a sala de bilhar. Assim mesmo, o Clube dos Maçons de Manchester era muito popular – talvez por ser um dos clubes mais baratos de Manchester – e prosperou até a Primeira Guerra Mundial e além, sendo o primeiro clube de Manchester a oferecer lanches sem carne, de forma patriótica, quando houve escassez de comida em 1917. Durante o dia, a Rua Cooper também contava com um restaurante público. Isto reflete como os salões maçônicos estavam dispostos a ser mais acessíveis enquanto espaços comunitários àquela época. Em Chorlton-cum-Hardy, o salão maçônico foi divulgado em 1900 como ‘disponível para assembleias privadas, festas de debutantes, cafés da manhã nupciais, recepções, etc.’, e uma grande variedade de seitas religiosas e partidos políticos reuniam-se lá, incluindo os congregacionalistas, presbiterianos, unitaristas e a Associação Liberalista. Quando o TUC reuniu-se em Hanley, em 1905, uma reunião para discutir a criação da Universidade Ruskin aconteceu no salão maçônico local. E enquanto a escassez do algodão levava a dificuldades consideráveis em cidades como Glossop, refeitórios sociais foram formados pelas cooperativas locais, dentro do salão maçônico. Este compromisso com a comunidade se refletia nas diligências de solidariedade dos maçons locais e tal generosidade e pensamento cívico garantiram a doação de 50 moedas de ouro pela Província do Leste de Lancashire para a Enfermaria Real de Manchester em 1910. Quando repassou esta doação em uma reunião na Grande Loja Local, J.B. Goulburn comentou que: ‘um insulto que é algumas vezes levantado sobre a ordem, afirma que embora os membros sejam ricos, mantém todas as coisas boas para si mesmos. É de nosso desejo, entretanto, ajudar objetos merecedores fora da maçonaria e, na verdade, a Grande Loja dos Maçons Ingleses, nos últimos vinte e cinco anos, doou 25.000£ para objetos fora da maçonaria inglesa’.

A criação de estabelecimentos cívicos em cidades como Manchester, Liverpool e Birmingham era a expressão das novas estruturas de poder que emergiam nas cidades eduardianas. As elites que controlavam que controlavam os conselhos municipais passaram a exercer uma nova forma de poder e tornaram-se uma oligarquia distinta. Os conselheiros eram apoiados por uma nova classe de profissionais do setor público – uma nova classe urbana. Estas novas elites de funcionários públicos expressava sua solidariedade frequentando a loja maçônica no fim de um dia de trabalho. Quando uma loja foi formada por oficiais e funcionários do Conselho Tutelar de Londres, a razão colocada na petição explicava que parecia natural que, no fim das reuniões do conselho, descansassem em uma loja maçônica. A relação próxima entre os novos conselheiros e os conselheiros oficiais é ilustrada de forma ampla em Manchester. Em 1902, o Conselheiro J. J. Lambert, um proeminente conselheiro conservador, faleceu. Lambert era uma destas figuras dos tempos heroicos do governo local. Deputado do Comitê do Desenvolvimento de Manchester e membro dos comitês de de gás, finanças e instrução técnica, ele era um grande incentivador da implantação de galerias nas ruas de Manchester. O Conselheiro Lambert também era Past Master da Loja de Chorlton  N° 1387 e o Grão Escrivão Provincial em West Lancashire, e em tal posição, ele estabeleceu a fronteira entre as províncias maçônicas entre East e West Lancashire.

Mas, ainda mais impactante do que o envolvimento dos conselheiros como Lambert na maçonaria de Manchester era a importância da maçonaria para os novos profissionais associados com conselhos. Mais impactante ainda é o número de professores que se envolveram na maçonaria nesta época. A profissão de professor de escolas particulares era uma profissão nova que emergiu dos anos de 1870. Inicialmente, o status social dos professores não era claro – professores das escolas urbanas costumavam ser mulheres de reputação, no mínimo, comprometida. Os novos professores do sexo masculino estavam ansiosos por marcar-se como profissionais de classe média e a maçonaria provia ótimos meios através dos quais estes professores podiam afirmar suas credenciais de classe média. Um processo similar era evidente com bibliotecários. Manchester era a primeira autoridade a estabelecer uma biblioteca pública com taxas de empréstimo e referência subsidiados em 1852. Entretanto, em 1871, também havia sido a primeira cidade a contratar mulheres bibliotecárias. Não era claro se os bibliotecários eram profissionais ou apenas pessoas sem qualificações e com salários baixos. Os chefes bibliotecários do sexo masculino viam-se como profissionais de classe média e, novamente, encontramos vários bibliotecários do município tornando-se maçons ativos, observando, novamente, que a associação à loja maçônica local dava o status de profissional de classe média. Em Manchester, isto se ilustra pela figura legendária de Charles Sutton, o bibliotecário chefe dos Bibliotecários Livres de Manchester de 1879 a 1920, que era um maçom entusiasta. Em 1916, Sutton recebeu uma exposição que marcava os cinquenta anos de serviço das bibliotecas de Manchester, e nesta ficou claro que Sutton aumentara o acervo da biblioteca de referência de 30.000 volumes para cerca de um quarto de milhão. O trabalho de Sutton foi comemorado após sua morte com um busto de bronze que ainda está na biblioteca. Vale lembrar que as condições da biblioteca hoje em dia são reportadas como pobres, e eu não posso pensar em uma forma melhor para a Associação comemorar de forma permanente seu centenário do que restaurando o memorial deste herói da sociedade cívica de Manchester, um dos mais memoráveis membros do início desta associação. Sutton não era apenas um maçom, mas também um apoiador entusiasta de quase todos os aspectos da vida cultural de Manchester, incluindo a Sociedade Estatística e a Sociedade Dialética. Nacionalmente, ele era proeminente na promoção do desenvolvimento da Associação de Bibliotecas, que tinha em si mesma um forte elemento maçônico. No congresso da Associação de Bibliotecas em Birmingham, em 1902, houve um a recepção no salão maçônico local, e entre os discursos ouvidos pela associação em seu congresso de 1900 havia uma palestra de Samuel Smith, o chefe dos bibliotecários de Sheffield, sobre coleções literárias maçônicas.

Este componente, fortemente profissional, da maçonaria eduardiana foi o que encabeçou o crescimento nas lojas de classe para membros de profissões particulares. Estas lojas foram descritas de forma vívida em um jornal maçônico como segue:

A loja do cabo telegráfico é para empregados da companhia de extensão telegráfica do leste. O Sir. Walter Raleigh uma casa maçônica para os que trabalham no mercado do tabaco… Especialmente apropriado é o nome (ventania) da loja onde se congregam químicos e farmacêuticos.  A loja Hiram é para arquitetos, a contadores oficiais tem nome autoexplicativo, a britânica para engenheiros… Estrela da Noite é o bem escolhido nome da loja onde os funcionários das companhias de gás e de coca podem ver a luz. Membros da companhia de água metropolitana encontram-se na loja de nome aquarius.

O desenvolvimento destas lojas de classe foi uma das maiores conquistas da maçonaria eduardiana. O Manchester Guardian descreveu como, em 1904, uma nova loja maçônica foi consagrada no Hotel Midland, cujos membros eram engenheiros e empreendedores do gás. A primeira página do Architects Journal de 1907 fez um relatório detalhado da consagração de uma loja para arquitetos.

As ligações próximas entre a maçonaria e o crescimento dos conselhos das cidades e novas profissões elevaram as tensões de forma natural. Em 1909, Padre Higley dirigiu-se à conferência anual da Associação de Guardiões Católicos de Londres.  Padre Higley era membro do conselho de Stepney e presidente do conselho do Asilo de Poplar e Stepney para doentes. Ele declarou que uma das principais causas da corrupção na vida pública era a Loja Maçônica. Afirmou que alguns guardiões fracos da lei que haviam sido condenados recentemente por corrupção eram maçons. Ainda disse que ‘embora a maçonaria inglesa pudesse ser inofensiva, quando os representantes públicos tornaram-se contratadores e os maçons passaram a realizar todo o trabalho, o público sofreu as consequências’. A posição da polícia já parecia melindrosa. Como professores e bibliotecários, a polícia era uma profissão nova e seu status não era nada claro.

Mais uma vez, ansiosos por provarem-se profissionais de classe média, muitos policiais se tornaram maçons.em 1906, alegações de irregularidades disciplinares sérias na força policial de Manchester levaram a um inquérito especial feito pelo prefeito. Foi alegado que a carta branca foi concedida a um policial por ele ser um maçom. Ele se suicidara depois e, antes, enviara uma carta ao chefe de polícia com referências maçônicas. O chefe de polícia alegou que o homem jamais havia sido membro da ordem maçônica, e que ele nunca recebera tal carta. Quando questionado se ele mesmo era maçom, o chefe de polícia respondeu que era, mas ‘um maçom muito fraco’.

Sugestões de corrupção, alegações de comportamento impróprio da maçonaria na polícia – de repente, a cidade eduardiana parece moderna novamente. Em dezembro de 1908, uma palestra sobre ‘católicos e a imprensa’ foi dada por Wilfred Hampson nos salões da Catedral de St. John, em Salford. Ele declarou que ‘a imprensa inglesa não era justa com os católicos, e que o mesmo poder que causou os problemas religiosos da França controla a imprensa aqui, e este poder é a maçonaria’. Padre Sharrocks, que presidia a reunião, endossou o discurso.  Os comentários de Hampson lembram-nos que havia outra ameaça para o interesse público da maçonaria durante os anos eduardianos, chamado de ansiedade a respeito das lutas ferozes acontecidas na França durante a separação total entre a Igreja e o Estado. Todo o espaço na imprensa dado as atividades de caridade dos maçons ingleses, a prática de tiro ao alvo e as partidas de golfe, seus banquetes esplendorosos e desfiles luxuosos da igreja, foi eclipsado por esta ansiedade. Foi dada atenção especial à participação dos maçons franceses nestas controvérsias. Considerou-se que o Grande Oriente se tornava a contrapartida aos jesuítas, grandes e ferozes entusiastas das convenções seculares. Preocupações pelos desenvolvimentos da França também levaram a mais ansiedade sobre o papel da maçonaria nos movimentos anticlericais na Espanha e na Itália. Isto deve ter exercido um profundo efeito nas percepções eduardianas sobre a maçonaria em geral, sem considerar o esforço dos maçons britânicos para distanciarem-se dos irmãos do resto do continente. A controvérsia europeia sobre a laicidade entrou no debate paralelo, britânico, sobre o papel da igreja na educação. Preocupações a respeito dos eventos do outro lado do Canal espalharam-se, sem dúvida, para os esforços dos maçons de língua inglesa, em seus esforços de provarem-se devotos do estado e da igreja. A decisão dos maçons do leste de Lancashire de financiar a construção de uma catedral em Liverpool, ao invés de um guildhall secular, prova outro aspecto desta preocupação.

Mas, se alguma coisa em especial marcou a diferença entre a maçonaria inglesa e francesa, foi o fato de o próprio rei, Eduardo VII, era maçom e grande protetor da ordem. A importância do papel de Eduardo como maçom não foi expressada por nenhuma ação direta do rei, mas talvez pela forma como marcou o imaginário popular a respeito da maçonaria, como algo ligado ao governo e ao rei. Em outubro de 1908, a justiça de Manchester tinha à sua frente um homem chamado Liddell, disse formalmente que havia estado em uma boa posição no comércio de algodão, que estava no lado de Moss. Ele havia sido preso por vagar pelas ruas, com uma mente aparentemente insana. Quando abordado pela polícia, afirmou ter tido visões de formas místicas e figuras flutuantes (possivelmente, havia conhecido John Yarker). Ele havia escrito cartas ao rei, e uma fora produzida na corte. Assim começava: ‘Em nome da lei mística e universal, eu o invoco, Albert Eduard, antigo Príncipe de Gales e agora proclamado Rei da Grã-Bretanha e Irlanda, como Eduardo VII, e denominado protetor da maçonaria’. Os magistrados perguntaram a Liddell se ele levava a maçonaria a sério ou apenas como uma brincadeira. Ele respondeu que levava a sério e que requisitou pessoas apropriadas para investigar a ordem. A irmã do réu apareceu e assegurou à corte que ele era inofensivo. Ela disse ainda que ele era abstêmio. Ele foi mandado ao asilo de Prestwich. Se a Associação de Manchester para a Pesquisa Maçônica foi uma resposta ao apelo de Liddell, nunca saberemos. Mas a associação era filha do mundo de Liddell, o mundo no qual os maçons construíam catedrais, ligavam-se a novas formas de instituições cívicas e moldavam nossas cidades modernas. A Associação de Manchester era filha da maçonaria eduardiana, um dos meios pelos quais os construtores da sociedade cívica de Manchester como o bibliotecário Charles Sutton, dedicado à construção da infraestrutura cultural e social das sociedades modernas. A Associação de Manchester pesquisa a maçonaria a cem anos agora, com resultados que deixariam Charles Sutton orgulhoso, e eu confio que continuará a fazê-lo por cem anos mais.

A edição da revista “The Square” é Volume 38, Nº 1, March 2012.

AUTOR DO LIVRO: “História da Maçonaria da Marca”, MADRAS EDITORA 2011…

WAGNER VENEZIANI COSTA

GRÃO-MESTRE PASSADO DA GLMMM DO BRASIL – DE FATO E DE DIREITO

GRÃO-MESTRE DO GRANDE PRIORADO DO BRASIL – DE FATO E DE DIREITO

GRÃO-PRIOR E GRÃO-MESTRE DO CAVALEIROS BENFEITORES DA CIDADE SANTA – DE FATO E DE DIREITO

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